quarta-feira, 9 de junho de 2010

A puta de Bolaño

A personagem feminina do conto As putas assassinas de Roberto Bolaño talvez acene para a relação (anti-)ética entre a linguagem e o homem. O conto é simples: trata-se de um diálogo entre uma mulher, presumivelmente uma puta e Max. A puta rapta Max e, prestes a tirar a sua vida, justifica o assassinato por vir. Há duas coisas, porém, que são dignas de nota nesse conto. Max não fala. Ainda que este conto consista apenas de um diálogo, na vez de Max falar há apenas tentativas de sinais através de expressões desesperadas da sua face e movimentos da sua cabeça, seu corpo, visto que da sua boca nada sai além de gemidos vazios. Não pode falar, não pode dar respostas e nesse seu silêncio fica exposta toda a sua impotência – refém da sua condição de falante –; Max é reduzido a nada.

Também é digna de nota a obsessão da puta por Max; obsessão que leva ela a querer matá-lo (supostamente) pela sua negligência egoísta enquanto faziam amor. Essa mulher, pois é mulher antes de ser puta, quer ser seduzida, quer que o homem saiba lidar com ela – ela não se importa em dar prazer a ele, só quer receber em troca a devida atenção. Está cansada de se dar e ser esquecida, usada, bolinada, adulterada, tudo isso sem que o seu possuidor se dê por conta dela.

A língua, essa puta, poucas vezes ganha a vez. É deixada sempre no canto, como algo já dado, já pronto é só pegar e dizer – sem trato, sem cuidado (que não se pense aqui em gramaticalisses). 

E, no entanto, sem ela o que somos? Talvez a sorte nossa seja que ela ainda não percebeu o nosso grau de dependência a ela. Ou talvez percebeu. Talvez já nem falemos mais. Talvez tudo o que falemos não passem de gemidos vazios, movimentos da cabeça, do corpo, expressões desesperadas das nossas faces.

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