segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Resposta ao Sergio Rodrigues no Todoprosa em respeito a sua resenha de "O habitante irreal"


Bem,

1. Fui eu que mandei o comentário do Antonio Marcos

1.1. Não quero me justificar (e foi a razão de não ter insistido na troca de emails) pois realmente o blog é seu e como algumas pessoas me lembraram não posso exigir nada e se recebi a resposta que recebi, que obviamente me deixou irritado, i brought it on to myself, nada a que reclamar então. Se alguma vez portanto no que segue parecer que falo dessas "fofocas" não foi minha intenção. Melhor esquecer do que fazer isso crescer mais ainda.

2. Vamos ao que importa, então, que são as duas grandes questões que foram levantadas durante esses momentos de "irresponsabilidades" (minha, do Antonio Marcos e sua) mas que são duas questões que acho que calhem começar num debate civilizado.

2.1. A primeira questão é sobre a maturidade da literatura brasileira

2.1.1. Quanto a isso eu, pessoalmente prefiro me abster no momento já que esse nunca foi o meu problema com o seu texto (como comentei com algumas pessoas, o problema não é ter sido Paulo Scott, podia ter sido Ricardo Lísias, podia ter sido Daniel Galera, podia ter sido João Paulo Cuenca, enfim). Acho que a resposta a essa questão, se a literatura brasileira está amadurecendo ou não, tem munição bastante para os dois lados, e como eu não estou nem a fim de me meter NESSA discussão específica momento, pois como disse, não foi ela meu problema com o texto e nem me vejo capacitado para avaliar a qualidade do livro mencionado do Paulo Scott deixarei esse ponto para quem está mais disposto. Acho que o Charbel faz bem esse papel de se ocupar nesse ponto no comentário dele aqui.

2.2. A segunda questão, que é o qeu me interessa, é o papel que a crítica tem/deveria ter no campo literário.

2.2.1. O problema que eu tive com o seu texto, Sérgio, e com alguns outros que você escreveu já (como o texto contra o Rubens Figueiredo, por exemplo, para um exemplo recente) é que, independetemente do conteúdo resenhado (e acho que por essa razão não se pode usar o argumento "fulano não leu o livro de beltrano") o que encontrei na sua resenha de "O habitante irreal" foram algumas afirmações a cerca do livro (e levadas adiante para afirmações sobre a literatura brasileira contemporânea) que ficaram sem justificativas. E esse é o meu problema, que a sua resenha se ponha como tentativa de levantar um debate crítico mas que (ao meu ver) não sustenta em nenhum momento as afirmações que faz, não as justifica.

2.2.1.1. Eu sei que os termos crítica literária e resenha as vezes tem gente qeu os distingue mas para os fins aqui eles são sinônimos. E o que eles significam para mim nesse contexto é que uma resenha e uma crítica literária são tentativas de elaborar um para texto a partir de um texto inicial que inclua um juízo valorativo mas que apesar desse juízo valorativo não ser um juízo universal (desculpe o Kantismo, é que sou da filosofia) ele se porá como um juízo que se pretende universal. Portanto quando faço uma resenha e afirmo x e y do livro, ainda que de fato esse x e y não possam ser categoricamente afirmados no meu juízo a uma pretensão a esse universalismo, pretensão que se veria "justificada" através  de um exercício
textual que tentaria evidenciar a validade de tais juízos. Simplificando a resenha/crítica seria um texto que diria algo de um texto original (sem o qual ela não sobrevive) e que tenta sustentar em suas argumentações a validade das suas afirmações (valorativas). Obviamente isso pode ser expandido, essa definição, mas partamos dessa ponto mais elementar que é o juízo valorativo (pretensamente) justificado.

2.2.2. Vamos a leitura

2.2.2.1. Quando leio o seu texto o primeiro parágrafo fala sobre a ausência de debate real sobre a literatura contemporânea nacional a partir da constatação que vivemos num ambiente onde não se "discute", não se tenta pensar, de realizar um debate crítico de fato (penso no 2.2.1.1.) mas apenas se diz "amém" ou "que o diabo o carregue": "infelizmente para “Habitante irreal”, não há debate algum. Atolada num ambiente besta que se assemelha a uma guerrinha entre fiéis e infiéis (existe ou não existe, é divina ou é uma fraude, vamos à missa ou não vamos?)" e devo dizer que quando comecei a ler eu concordei, não sobre a questão de ser um livraço ou não (não tenho como afirmar, não o li), mas sobre o ambiente muitas vezes ser reduzido a afirmações valorativas e definitivas sem o suporte textual que pelo menos faça o caso delas. Comecei, portanto, esperando que o que viria a seguir seria um exercício de mostrar como e porque o "O habitante irreal" é um livraço.

2.2.2.2. Quanto ao segundo parágrafo também não há muito o que se dizer fora que há alguns elogios mais específicos, mas ainda, vazios, vazios não porque sem sentidos, mas por estarem carentes de uma justificativa que concretize suas abstrações. Serio, diz portanto coisas como "não houve guinada no caminho (...) O que houve foi crescimento, amadurecimento, consideração honesta dos limites e potencialidades da arte em face de toda essa confusão que a ultrapassa e que se costuma chamar, à falta de palavra melhor, de vida." Obviamente eu tenho certas encrencas com o uso da palavra "real" negativamente a seguir em contraposição a "vida mesma", mas enfim, isso são outras questões, isso seria par discussão "o que é a literatura e qual o seu papel?" masindependentemente disso a questão é que esses elogios ainda estão vazios de sentido. Coisas como "crescimento", "amadurecimento", "consideração honesta dos limites e potencialidades da arte" são elogios que com a sua vagueza só podem serem compreendidos de fato (e não apenas aceitos) quando o crítico se põe a fundamenta-los. Isso não ocorre ainda nesse parágrafo mas isso não é um problema já que a resenha não acaba aí.

2.2.2.3. No terceiro parágrafo temos um breve resumo da primeira parte do livro e no segundo momento o Sérgio dá a primeira tentativa de justificar os seus juízos. Diz ele que "O maior mérito da primeira metade do romance é a voz crível de Paulo, filtrada por um narrador em terceira pessoa que pouco descola dele". Me pergunto duas coisas:

2.2.2.3.1. Primeiro como é que vamos julgar esse crível? Esse crível para o Sérgio pode ser muito distante do crível para mim, logo a unica alternativa que me parece ser possível para tentar resolver esse impasse (que me parece de fato insolúvel, mas precisa de uma solução prática) é uma amostra dessa "voz crível", coisa que não acontece, o resenhista não mostra.

2.2.2.3.2. A segunda questão seria se é possível dizer que "voz crível" é argumento suficiente para sucitar todos esses adjetivos grandiloquentes?

2.2.2.3.3. Enfim, não me parece que esse argumento seja usado como sustentação principal do seu juízo, mas sim como um dos elementos que compõem o livro e que atestariam a sua qualidade, mas que não me parece com o elemento que, e aqui digo eu, demonstrariam que esse livro é capaz de literatura brasileira de sua irrelevância

2.2.2.4. No parágrafo seguinte o autor faz justamente aquilo que me pareceu. Diz ele que "Não seria pouco, mas o que faz de “Habitante irreal” um livro excepcional é o salto mortal que vem em seguida. Certamente o que vem agora seria aquele argumento que para o seu leitor. Vamos então a esse argumento:

2.2.2.4.1. O Sergio rodrigues começa explicando que no livro aquilo que se mostrara simples é na verdade complexo ("Arrastados por um mecanismo mais complexo do que o início sugeria, abandonamos Paulo num autodestrutivo exílio londrino para mapear, entre diversos pontos de vista, as consequências da bagunça que ele deixou para trás ao fugir.").

2.2.2.4.2. Em seguida diz que o autor consegue, numa análise que ele não vai fazer no momento (que no presente post ele explica brevemente o que seria essa análise), que o romance "se expande entao para fora e ao mesmo tempo para dentro" e que nessa expansão e contração "revela-se um espelho político-social de impasses coletivos e, no caminho oposto, um objeto que se quer tão xamânico quanto a bizarra máscara construída por Donato, o "índio mais não índio do qual já se teve notícia".

2.2.2.4.3. Me parece no primeiro momento que há dois movimentos aqui que são a razão do livro ser um livraço. O fato dele revelar que tudo aquilo que era simples na verdade é complexo. O que pode até é um argumento, mas nada que dê fôlego pra as afirmações finais do autor. E o fato de o livro se expande e contrai. O meu primeiro problema é tentar entender o que isso quer dizer e de que maneira isso engloba mito e história. Isso, que seria a chave para o "salto" que transforam o livro em excepcional fica vazio. Outro ponto que também me parece prejudicial é justamente por que o "cruel espelho político-social de impasses coletivos" e a sua contraposição "que é um objeto que "se quer tão xamânico quanto a bizarra máscara construída por Donato". Eu não sei, posso estar errado pois eu, pessoalmente, achei muito confuso esse parágrafo (provavelmente pois não li o livro), mas me parece que a razão do livro ter sido tão elogiado é por ele ter justamente revelado algo que o Sergio menciona no inicio da resenha, que "Escolhas que, pensadas ou impulsivas, têm consequências. Consequências que, no balanço coletivo das vidas, moldam, entre outras coisas, a cara de um país." Ou seja, a questão é que o livro tem o seu valor não pelo que ele faz  mas pelo "o que ele fala", pelo seu conteúdo. Obviamente alguém pode vir dizer que é idiota ignorar o conteúdo mas bem, aí é outra questão que pode e deve ser discutida (como disse "o que é literatura e qual é o seu papel?"). Não é que o conteúdo deva ser ignorado, mas é a forma que faz o conteúdo e que lhe dá o valor, independente do que ele seria. É o romance, o poema, o conto que me revela que aquele conteúdo/história tem valor e não o inverso. Pelo menos é assim que penso e entendo que esse é o ponto "fraco" da minha "crítica à crítica". Se discordarem desse ponto obviamente não há por que dar valor ao que falo. No entanto, se aceitarem o valor do conteúdo por si só, fica difícil não aceitar o que vem com isso, que é todos aqueles livros que tratam de "temas bonitos" independentemente da sua qualidade. Obviamente eu gosto de acreditar que é possível que isso possa haver nesse livro do Paulo Scott (uma forma que convoque o tema), mas a questão é que simplesmente isso não aparece na resenha, não me apareceu essa justificativa nesse trecho que comentei, trecho que, me parece, o centro, a principal justificativa para a resenha do Sérgio.

2.2.2.5. Por fim há um parágrafo final onde o autor minimiza alguns defeitos ocasionais do autor - o que não tem problema, já que certamente não parecem ser defeitos que estragariam a experiencia do livro. E de novo as afirmações de que esse livro é um livraço. Que "Habitante irreal” reforça a impressão de que a literatura brasileira está entrando numa fase qualitativamente madura após a explosão quantitativa da última década." e que "depois dele fica mais difícil negar que quem insiste na tecla da nossa “irrelevância” literária é ruim da cabeça ou doente do pé."

2.2.3. Obviamente há justificativas e argumentações nessa resenha, há tentativas de "sustentar" as suas afirmações, mas o problema é que essas justificativas não me convenceram (e só posso falar por mim) da sua ligação com juízos tão grandiloquentes como "a literatura brasileira contemporânea corre o risco de nem se dar conta de que acaba de ganhar um livraço." ou como o tipo de livro que "depois dele fica mais difícil negar que quem insiste na tecla da nossa “irrelevância” literária é ruim da cabeça ou doente do pé.". Enfim, são afirmações fortes, pesadas e para isso requerem justificativas mais contundentes. Certamente "o ambiente, como foi dito, não ajuda.", mas é precisot também que aqueles que resolvam falar do livro falem dele de forma a ajudar.

2.2.4. Um post scriptum : A razão disso ser um problema, dessa "ausência de sustentação" que venho martelando tanto, talvez seja boba, talvez parta de uma ingenuidade minha, de um velho apego à "metafísica da presença" como um amigo me diz tantas vezes. Eu realmente acredito (e isso de maneira arbitraríssima, provavelmente) que se o espaço da crítica no campo literário tem uma responsabilidade (seja de julgar, liberar sentidos, fazer ajustes sociológicos, pensar idéias, enfim, que seja) é que deve haver uma responsabilidade (muito maior do que a minha, por exemplo, que não ocupo esse espaço no momento, ou de outras tantas pessaos que vem aqui comentar e que comentam só um "ahahahah que ruim, você num sabe nada" ou "ahahuahauhau adorei tou te seguindo") com o que se fala. Você tem um espaço privilegiado que o faz a sua voz chegar muito mais longe que a minha, por exemplo, ou a do Antonio Marcos. Obviamente você tem todo o mérito de ter chegado onde chegou (e eu mesmo gosto de coisas que vocÊ escreve, acho que mereceu o espaço) mas eu acredito, de novo, que existe uma espécie de ética, um dever, por se suportar um espaço público (ainda que seja na prática um espaço privado, que a veja te cede, que pague para você usa-lo para certos fins - quando falo de espaço público quero simplesmente dizer que você é escutado, que as pessoas te escutam) - o que não quer dizer uqe deve-se transforma-lo em uma tarefa onerosa, como ser síndico de condomínio, não é isso. Essa ética, esse dever é simples. São basicamente duas coisas:

2.2.4.1. Justificar todos os passos, não fazer comentários infundados e/ou disparatados

2.2.4.2. E estar aberto a críticas (quando feitos de forma justa, como eu espero que essa tenha sido construída), com respostas que não esperamos ouvir mas que tem em todo o seu mérito, todo um caminho que pode, inclusive, mostrar que tudo o que dissemos estava equivocado (obviamente esse é um caso extremo de crítica bem feita somado a um tipo zen, que a recebe, ausente de qualquer vaidade)

2.2.4.3. Adcionaria um terceiro ponto que é uma repetição do que foi dito acima. Não é em razão de uma pessoa não ter lido o livro 'x' que não podemos comentar o qeu a pessoa escreve sobre o livro x. É óbvio que não poderemos comentar o livro x, mas poderemos certamente ver como funciona a crítica dessa pessoa. Penso, por exemplo, como no momento que vou ler Auerbach. Obviamente não posso querer chegar e comentar um pingo sobre as zilhões de referências de literatura medievalistas que existem ali mas certamente posso olhar e ver a sua estratégia de abordar o texto, posso elogiar e aprender, mas posso também descobrir falhas (que dizem respeito ao Auerbach, e não ao texto abordado). Qual o valor disso, de ler crítica pela crítica? Bem, acho que tentar aprender a ler melhor, a ver mais, a experienciar mais, para quem sabe quando falar dos textos que eu quero, que me são importantes, que amo, eu possa lê-los um pouco melhor do que se nunca tivesse lido Auerbach, Antonio Candido, Edmund Wilson etc.

3. E como complemento, em relação ao texto acima o problema é que você fala que vai "tratar da questão séria" mas faz o mesmo erro que na oura, enuncia uma série de juízos ("o ultimo livro do fulano é o melhor livro dele") sem dar a razão deles. Ok, eu entendo, é algo trabalhoso, mas esses argumentos são "vazios" (no sentido que usei anteriormente em 2.2.2.2.) e não ajudam a levar nenhum debate a frente.

4. Enfim, espero que essa discussão possa se desenvolver, não só na caixa de comentários obviamente.

5. Aliás, posso até ter perdido meu tempo demais. Tenho certeza que vai ter gente que vai dizer: "seu idiota, crítica da crítica é besteira" mas enfim, não é isso, não se trata disso, isso é apenas uma tentativa de justificar a minha posição contrária a resenha, não pelo seu conteúdo e seus juízos finais, mas pela forma que ela faz isso, que, na minha opinião, carece do elemento fundamental de uma boa crítica.

5.1. Talvez eu esteja sendo chato, talvez esse não seja o espaço para isso, para essa "justificação", mas enfim, como eu disse, gosto de crer, talvez com toda a minha "metafísica da presença" que o crítico tem um papel, tem um dever que, alias não deveria ser restrito ao crítico, mas um dever que é, ao menos, justificar àquilo que diz, que não se pode simplesmente lançar para o alto aquilo que se quiser, mas que há e deve sempre haver responsabilidade naquilo que fazemos (e dizemos). Mas de novo, talvez eu seja apenas um velho idealista :)

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Au-delà de la mémoire - Réflexions désorganisés sur la mémoire chez Sebald


W. G. Sebald a fini son dernier livre (le dernier publié en vie) avec une histoire du narrateur à propos du livre qu’il lisait, un livre que le protagoniste, Austerlitz (aussi le titre du livre) lui avait donné à la première rencontre des deux. Le livre en question est un essai de reconstruction du passé d’un ancien rabine lituanien. Mais l’auteur de ce livre, au milieu de toutes ces pérégrinations, ne trouve rien, ni mémoire, ni registre ; il n’a trouvé que des traces de destruction qui ont tout rasé. Si avant il avait quelque chose là-bas, on ne peut plus le savoir.

Austerlitz raconte, à travers d’une de ses connaissances (le narrateur), la recherche de Jacques Austerlitz, un historien de l’architecture, pour comprend l’inquetation qui le hante tout au long de sa vie; l’impression constante d’un exil, le sentiment de non appartenance partout. D’abord prises par des visions brutes et des délires qui l’affligent régulièrement, Austerlitz trouve son madeleine pendant une visite nocturne à une ancienne gare anglaise. Dans un lieu habituellement fréquenté par d’autres personnes perdues dans la nuit comme lui, c’est qu’il est confronté à la mémoire de son arrivée en Angleterre où il a été reçu par ses parents adoptifs. Cette mémoire l’amène dans un autre délire qui le conduira dans les coins cachés de sa mémoire. Il commence à prendre conscience de certains blocs qu’il avait imposé sur lui-même – comme, par exemple, sa complète ignorance de l’Allemagne ou les vertiges qu’il souffrait quand il a essayé de se souvenir de certains mémoires – jusqu’au moment, après beaucoup de pérégrinations, des échecs et des succès, presque par hasard, où à Prague il ne dévoile pas son passé, mais de brèves indications qu’il avaient une place. Les indices de ce qui aurait pu être Jacquot (maintenant le prénom en tchèque) Austerlitz.

Et pendant toute la journée d’Austerlitz, il y a quelques éléments mis en évidence. Le premier élément est peut-être le plus grand mystère qui existe chez Sebald : les photos. Toujours en noir et blanc, sans sous-titre et, parfois, sans rien à voir au récit, c’est notable qu’elles simplement interrompent le récit. En fait, elles ne restent pas à côté du récit (comme une photo qui montre quelque description dans un texte) ou à la fin des paragraphes. Elles sont comme les intrus qui nous volent, nous attirent l’attention et, sans cesse, nous détournent du texte à l’image. Les photos, on peut dire, avec ses interruptions, en dépit d’être en noir et blanc,  elles colorient le récit.

Il y a même des moments où il n’y a pas de photos et pourtant nous pensons que ça serait le moment exact pour les mettre. En plus, dans autres moments, l’auteur met des photos qui nous surprennent grâce à sa position par rapport au texte. Elles sont mises de façon à nous poser la question à propos de la relation entre le texte et la photo, nous nous demandons ce qui est dans sa mémoire (c’est-à-dire, dans le texte) que soulève la nécessité d’une image.

Donc, en face à cet impasse nous sommes obligés d’enquêter encore une fois (avec la photo dans la main) et un de ses effets c’est précisément (peut-être on peut dire maintenant qu’il y a une théorie de la mémoire chez Sebald ?) la sensation de que la mémoire est trop éparpillée pour se limiter à un discours plus ou moins organisé.

Au-delà du récit, elle déborde et fini, donc,  pour prendre la forme de photo, dessins et objets. Les photos, enfin, n’ont pas un rôle de simple illustration (comme l’attendu dans un roman qu’utilise des photos).  Au contraire, elles sont des éléments fondamentaux au projet de mémoire chez Sebald, comme des mémoires ou superposées aux mémoires racontées, en donnant une instabilité au discours narratif, ou comme mémoires qui ne sont pas touchées dans le récit simplement parce que elles ne peuvent pas être écrites, c’est-à-dire, la mémoire est elle-même l’image.

Comme la madeleine qui a provoqué un souvenir à travers le goût (la mémoire est dans le goût !), certaines mémoires, comme j’ai déjà dit, ne se limitent pas au discours, mais elles viennent à nous sous des formes plus primitives, et non organisées, tel que des images, des odeurs, des goûts, etc. Dans le cas d’Austerlitz quelques images ne peuvent pas être réduites à un discours écrit.

*

Une autre chose remarquable, mais que je n’ai pas de temps pour en parler, est la profession d’Austerlitz : être un historien de l’architecture n’est pas indifférent. Parmi les souvenirs dans le livre il y a un grand privilège à la lecture des œuvres d’architecture. On va trouver dans la description de la nouvelle Bibliothèque Nationale Française et du fort Breendok les très originelles réflexions sur le temps, la mémoire collective et les ruines. Austerlitz voit ces monuments comme les œuvres d’une pensée qui est destinée à être surmontée et qui laissera comme signe de son existence ces vieux œuvres éloignés de son sens originel.
Et il y a aussi de notable le silence qui entoure le récit. Pendant une bonne partie de ses pèlerinages, que ce soit dans les parcs, les gares, les archives, les cimetières, les bibliothèques, les musées, quel que soit le lieu, ou il est vide ou il y a presque personne. Le livre et les rapports d’Austerlitz se retrouvent constamment entourés par ce sentiment ombreux, comme s’il était juste un fantôme à errer à travers un monde depuis longtemps abandonné.

*

Le livre se termine avec un livre, un livre qui répète, ou anticipe, la voie de Jacquot (il n’est plus Jacques) Austerlitz : une recherche de son passé que ne se trouve rien que de la terre brûlée.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Sobre a grande leitura

E aquele momento em que ao fechar o livro e apagar as luzes da mesa de escrivaninha. Lentamente vou me ajeitando para mais uma das posições que vou assumir durante o sono e lentamente também vou fechando os meus olhos, sem pressa, apesar da hora, de cair nas graças do sonho. E nessa hora, em minha mente, também vagorasamente se desligando, se preparando, surgem as figuras, ainda que distantes e ofuscadas de Jaime Deza (narrador de Seu rosto amanhã – vol. 1 Febre e lança, de Javier Marías) e seu velho amigo Peter Wheeler. Não consigo nem me importa lembrar o que falavam, sei apenas que estavam os dois sentados, o último com seu charuto na boca num dos degraus da escada quase esbarrando no cinzeiro aos seus pés e o primeiro, em gesto de companhia, sentado numa escadinha próxima escutando aos jogos do velho. Sei apenas que os dois estavam lá e aquilo era música para os meus ouvidos.

Não os chamei e nem estava querendo refletir sobre o que havia acabado de ler e no entanto Dez e Wheeler voltaram uma última vez na minha noite para reencenar a última conversa que tiveram. Não lembro do que falavam, se falavam em inglês, espanhol ou português, se tratavam de Luisa, de Tupra ou da guerra civíl espanhola. Lembro apenas que naquela noite ao fechar os olhos deixei aberta uma pequena fresta da porta aberta de onde saltava uma luz baixa e os sons de Wheeler fumando seu charuto ao pé da escada.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Zumbidos lidos


Há uma certa instabilidade presente na novela Disgrace, de J. M. Coetzee. Algo como o zumbido de um mosquito, que nunca podemos ter certeza se realmente sobrevoa os nossos ouvidos a menos que esteja sobrevoando os nossos ouvidos.

*

Não sabemos, num primeiro momento, se aquilo que nos agita são as atitudes moralmente oblíquas do protagonista – oblíquas não por se mostrarem como ilógicas ou sem sentido, mas por ser uma moral que se recusa a fluidez do mundo atual. Rígida é a palavra que conduz as atitudes do protagonista, preferindo cair num ostracismo (se é que já não estava) e manter-se fiel à sua balança do que curvar-se e esquivar-se da responsabilidade dos seus atos.

*

O mundo onde caminha David Lurie já não é mais o mesmo. Para um acadêmico, decadente, que ensina a poesia romântica numa metrópole esse novo mundo que se anuncia na África do Sul, principalmente no interior, não lhe deixa fincar os pés. Acostumado aos resguardos da guia mestre do mundo ocidental, a razão, David simplesmente não sabe lidar com Petrus, esse homem da terra que ainda que caipira, maneja como ninguém as regras do homem branco com as dos nativos. Manejo esse, porém, que não se dá de forma límpida e sutil, mas de maneira grossa e tosca que gera verdadeiros Frankensteins como a proposta de casamento (e de proteção) que Petrus faz a Lucy no final do livro em troca da sua terra, misturando a ganância do homem branco com obrigações familiares nativas. Como confiar nas palavras de um homem assim?

*

Falando em palavra, vem a mente um dos poetas favoritos de David, William Wordsworth. Palavras que valem. No início do livro temos a leitura que o professor Lurie faz de um poema de Wordsworth sobre a inquietação de um homem com a falta de graça no mundo real.

*

No mundo real David encontra apenas violência. Seja em atos de puro ódio como o estupro que sua filha sofreu (sem contar também nas agressões físicas que sofreu ao tentar proteger Lucy) ou em coisas estúpidas como o trato que os homens do incinerador davam aos cachorros sacrificados – por serem abandonados, por não terem um lugar no mundo –, quebrando seus ossos a pancadas para que entrassem direito no cremador.

*

O zumbido é uma leve sensação de hesitação que parece percorrer toda a fala do narrador em terceira pessoa desse livro. Teme-se a todo o momento de que aquela escolha se mostrará equivocada, se mostrará incapaz de se subscrever aos desejos do autor. Momentos onde isso se evidencia podem ser encontrados em certos momentos onde até esquece-se, devido ao uso do discurso indireto, livre ou não, que narrador e personagem não são uma só pessoa. Essa fala incerta acaba por deixar comprometida qualquer tentativa de apreender aqui uma realidade objetiva.

*



*

(...)

*

Talvez esse livro não passe de um zumbido que simplesmente não nos deixa esquecer que algo há de errado.

terça-feira, 15 de junho de 2010

À memória de Austerlitz


W. G. Sebald termina seu último livro (último publicado em vida) com um relato do narrador sobre o livro que lia, livro que o protagonista, Austerlitz (também título do livro) havia lhe dado no primeiro encontro dos dois. O livro em questão é a tentativa de reconstrução do passado de um velho rabino lituâno.Mas o autor desse livro, em meio a todas as suas peregrinações, nada encontrará, nenhuma memória, nenhum registro; encontra apenas rastros de uma destruição que tudo nivelou. Se havia algo ali antes não se pode mais saber.

Austerlitz relata, através de um conhecido seu, a busca de Jacques Austerlitz, um historiador de arquitetura, para compreender uma inquietação que o persegue durante toda a sua vida: a constante impressão de um exílio, a sensação de não pertencer a lugar algum. Inicialmente tomado por algumas visões toscas e delírios que o acometem regularmente Austerlitz encontra a sua Madaleine numa visita noturna a uma velha estação de metrô. Vagando por esse reduto de almas perdidas na noite se depara com a memória de sua chegada na Inglaterra onde foi recebido pelos pais adotivos. Esse encontro que o põe em mais um delírio acaba por levá-lo aos cantos mais recônditos de sua memória. Começa a tornar-se consciente de certos bloqueios que impunha a si mesmo, como a completa ignorância que tem em relação a Alemanha ou as vertigens que sentia quando tentava se lembrar de certas recordações, até que enfim, quase por um acaso desencobre em Praga não o seu passado, mas breves indícios de que teve um lugar. Indícios de quem poderia ter sido Jacquot (agora de prenome tcheco) Austerlitz.

E durante toda essa caminhada de Austerlitz há alguns elementos que se destacam. Em primeiro lugar o livro é recheado de fotografias, muitas vezes elípticas, que supostamente o próprio teria tirado. Essas fotografias que muito além de exemplificar o que o autor descreve acabam dando-nos uma nova camada de interpretação dos relatos por nos mostrar aquilo que chamava o olhar do fotógrafo, aquilo que talvez o trazia mais perto dos seus objetivos. Enfim, para apontar para aquilo que escolheu mostrar.

Outro ponto é que ser um historiador de arquitetura não é irrelevante. Nas recordações presentes no livro existe um privilégio muito grande a leitura de obras arquitetônicas. O livro tem duas das suas mais belíssimas passagens na descrição do forte de Breendok e da nova Bibliotèque Nationale. Austerlitz enxerga nessas obras verdadeiros monumentos de um pensamento que estará fadado a ser superado e que deixará como sinal de sua existência apenas essas velhas obras arquitetônicas.

E há, por fim, o silêncio que circunda a obra. Ao longo de grande parte das suas peregrinações seja em parques, estações, arquivos, cemitérios, bibliotecas, museus, qualquer que seja o lugar, ou está vazio ou o número de pessoas ali é mínimo. O livro e os relatos de Austerlitz acabam ficando constantemente envolvidos por essa sensação sombria, como se ele fosse apenas um fantasma a vagar por um mundo já há muito abandonado.

Mas Austerlitz não é um livro sobre o resgate da memória de um homem. Esse livro cujo título tão facilmente se confunde com Auschwitz trata-se na verdade de um momento de confronto da europa com um esquecimento. Assim como Austerlitz passa grande parte da sua vida ignorando e muitas vezes fugindo de seu passado, o velho continente, durante os anos subsequentes a segunda guerra mundial, desvia suas atenções da força que nivelou seus estados, seus prédios, seus povos ao solo. Com os olhos virados apenas para o que acontece lá fora (falamos aqui evidentemente da guerra fria) toda o vazio gerado pela destruição da guerra acaba em pouco tempo sendo preenchido pelas forças emergentes da URSS e dos EUA que constroem, junto as suas bases militares, uma nova cultura sem relações naturais com a sua memória. É portanto com o fim da guerra fria, fim desse foco, que a Europa tem a oportunidade de tentar desenterrar o que resta da sua estória. Medo de perceber que para enxergar esse monstro que a assolou basta olhar no espelho.

O livro termina com um livro, um livro que repete, ou antecipa, o caminho de Jacquot (não mais Jacques) Austerlitz: uma busca por seu (ante)passado que encontra apenas terra batida.


quarta-feira, 9 de junho de 2010

A puta de Bolaño

A personagem feminina do conto As putas assassinas de Roberto Bolaño talvez acene para a relação (anti-)ética entre a linguagem e o homem. O conto é simples: trata-se de um diálogo entre uma mulher, presumivelmente uma puta e Max. A puta rapta Max e, prestes a tirar a sua vida, justifica o assassinato por vir. Há duas coisas, porém, que são dignas de nota nesse conto. Max não fala. Ainda que este conto consista apenas de um diálogo, na vez de Max falar há apenas tentativas de sinais através de expressões desesperadas da sua face e movimentos da sua cabeça, seu corpo, visto que da sua boca nada sai além de gemidos vazios. Não pode falar, não pode dar respostas e nesse seu silêncio fica exposta toda a sua impotência – refém da sua condição de falante –; Max é reduzido a nada.

Também é digna de nota a obsessão da puta por Max; obsessão que leva ela a querer matá-lo (supostamente) pela sua negligência egoísta enquanto faziam amor. Essa mulher, pois é mulher antes de ser puta, quer ser seduzida, quer que o homem saiba lidar com ela – ela não se importa em dar prazer a ele, só quer receber em troca a devida atenção. Está cansada de se dar e ser esquecida, usada, bolinada, adulterada, tudo isso sem que o seu possuidor se dê por conta dela.

A língua, essa puta, poucas vezes ganha a vez. É deixada sempre no canto, como algo já dado, já pronto é só pegar e dizer – sem trato, sem cuidado (que não se pense aqui em gramaticalisses). 

E, no entanto, sem ela o que somos? Talvez a sorte nossa seja que ela ainda não percebeu o nosso grau de dependência a ela. Ou talvez percebeu. Talvez já nem falemos mais. Talvez tudo o que falemos não passem de gemidos vazios, movimentos da cabeça, do corpo, expressões desesperadas das nossas faces.

domingo, 6 de junho de 2010

Tchekhov.


Em suas próprias palavras: As obras de arte dividem-se em duas categorias: as de que gosto e as de que não gosto. Não conheço outro critério.

Das dele gosto, e muito.

Mais não posso, nem sei, falar. apenas acrescento que quando leio cada conto seu me lembro porque amo tanto a leitura como ele me faz bem. Exemplo disso é A dama do cachorrinho, conto perfeito.

(Mais Tchekhov aqui)